domingo, 19 de agosto de 2007

A música erudita aos 51


Num dia especial para mim, fica aqui uma leve abordagem da minha relação musical com a música erudita, dita clássica. Começou cedo e acabou depressa, para recomeçar muitos anos mais tarde, já na idade adulta e em recordação de temas passados e com mais de duzentos anos. Quando alguém refere a nostalgia de se ouvirem composições de pop/rock, com trinta anos, desvalorizando o facto pela carga de passado que transporta, esquece-se muitas vezes a circunstância de a música erudita, contar já centenas em cima e continuar actualíssima.

Aos onze anos, ouvir em auditório conjunto, a obra integral da sinfonia do Novo Mundo de Dvorak, era demais para um puto que começava a escutar Cat Stevens e os Beatles ou ainda o barítono Johhny Cash.

Além disso, a música religiosa em coral, era experimentada ao vivo e com participação na segunda voz, de um conjunto de quatro, por banda dos Pequenos cantores da Imaculada, na igreja dos Congregados de Braga em altura de cerimónias pomposas, com todas as circunstâncias da seriedade de uma celebração eucarística.

Talvez por isso, a música coral, continua a ser uma das maiores maravilhas que o ouvido pode escutar e é por isso que um dos discos que prefiro, entre toda a música coral que já me foi dado ouvir, é precisamente uma Missa, a alemã, D. 872, de Schubert.

Nas lojas de discos nacionais ( e até estrangeiras, pelo menos por onde passei), a música religiosa de Schubert, contida nessa missa alemã, não se exibe em abundância. Para além disso, a versão precisa que me agrada, é antiga, anterior a 1974 e serviu de indicativo ao programa de rádio Em Órbita, de Jorge Gil. Ainda não consegui arranjar o disco, com o coro original em alemão. Quando o ouvir, saberei com certeza absoluta que é aquele coro que ouvi e nenhum outro.

Para já contento-me em escutar religiosamente e com o maior prazer auditivo possível , a versão da missa, gravada em 1988, cantada por alemães, ( como deve ser) do coro Rias- Kammerchord- RSO- Berlin, dirigido por Marcus Reed.

É o que faço neste momento. E a seguir ouvirei, o terceiro andamento da Sinfonia nº 9, Adaggio molto e cantabile, de L.v. Beethoven, na versão, para mim inultrapassável, da Orquestra Filarmónica de Berlim, dirigida por H.von Karajan, numa gravação de 1963, a melhor que conheço de todas as que me foi dado ouvir ( e foram quase todas as de maestros conhecidos).

Esta sinfonia nº 9, de Beethoven, particularmente esse andamento, concentra, para a minha sensibilidade, toda a magia da música erudita porque sublima o espírito para a estratosfera da imaginação superior.

Muitas outras obras de música erudita conseguem esse efeito fantástico, nas condições apropriadas. Uma delas, é a música de Mozart, no Ave verum corpus, k.619.

A música erudita que me impressiona, eleva e espírito para a fronteira do religioso e do contemplativo. A música popular que me interessa, mostra-me o caminho do ritmo e das sensações diversas do mundo dos sentidos e do vivido. As duas, são uma só no universo da minha vivência e foi assim que equilibrei e harmonizei a dicotomia que em pequeno me pretenderam impingir: a de que a música popular era banal, medíocre e dispensável, por contraponto à clássica, erudita e elaborada para o espírito superior.

Acho que me vinguei dessa violência, porque acabei a gostar de ambas com a mesma intensidade.

Uma pequena composição de Kevin Ayers ( May I?)ou o Canon de Pachelbel, surtem um efeito semelhante no meu gosto, em circunstâncias precisas. Por isso, poderia fazer uma colectânea de preferências musicais, misturando todos os géneros e modos de fazer música, até a chamada pimba. Um clarinete de Mozart, para mim, em certas composições equivale à guitarra de Duane Allman ou de Eric Clapton. Um naipe de cordas de Elgar, equivale muitas vezes, para mim, às guitarras acústicas de Paco de Lucia e Larry Coryell, ou mesmo Al Di Meola, em certas composições.

4 comentários:

MARIA disse...

É curioso, partilho claramente dessa mesma forma de estar relativamente à música. Talvez porque a verdadeira música, para mim, ultrapassa os canais sensoriais e soa bem aos ouvidos da alma, elevando-a.
Não sendo assim, por melhor que seja a técnica , para mim, será sempre, simples ruído.
Tudo o que aqui trata é fascinante.
Inevitavelmente, toca-nos a alma, tal como a belíssima música que referenciou.
Não pode deixar-se de agradecer a partilha generosa.
Um beijinho
Maria

MARIA disse...

Olá José,
Entrei hoje nesta caixinha só para dizer-lhe o seguinte : sei das características intimistas deste espaço. Também julgo já ter compreendido o suficiente a seu respeito para deduzir, com segurança, que não exibiria no seu blog qualquer prémio.
Ainda assim, atribuí-lhe no "Maria" o "Power of Schooze Award" , como pública declaração dos laços de profunda admiração, respeito e carinho (que está sempre associado à admiração, como estima ), que me unem a este espaço onde aprendo e me perco esquecida entre as palavras sábias e bonitas com que o constrói.
(como pré-acordado e aceite, não carece de resposta)
Certamente já descansará, pelo que lhe desejo boa noite e despeço-me com um beijinho amigo.
Maria.

josé disse...

Maria:

Seja o que for esse Schooze award, obrigado.Um prémio agradece-se sempre, pela distinção da atenção.

MARIA disse...

Ah, de nada José. Só vale o gesto e a lembrança que é para si , sempre muito elevada na consideração, no apreço, por tudo o que me permite aprender neste cantinho.
Obrigada por responder. Sabe que isso me deixou muito feliz.
Um beijinho.
Maria