domingo, 7 de outubro de 2007

A guitarra acústica

No início dos anos setenta, comecei a dar importância à sonoridade acústica das guitarras que escutava nos discos, passados na rádio.

Não recordo que discos, mas sem dúvida que alguns dos Crosby Stills Nash & Young, ou dos seus elementos a solo, particularmente Neil Young e Graham Nash. O Lp Harvest, de Neil Young, de 1972 era uma referência na música acústica, particularmente a sonoridade seca e vibrante de uma particular guitarra cuja marca nem conhecia, mas que era diferente de outras que também se ouviam.

Também a exposição ao género country, passado com frequência nas ondas da Rádio Comercial , por Jaime Fernandes, contribuiu para educar o ouvido na distinção dos sons provindos das cordas metálicas em caixas de madeira.

Em certa altura do ano de 1975, tomei a decisão firme de arranjar uma guitarra, comprando um modelo que me agradasse.

Para isso, passei a pesquisar nos anúncios e fotos de revistas, a guitarra que me interessava.

Até essa altura, em Portugal, eram raras as guitarras acústicas, com formas americanas. Viam-se em espectáculos ao vivo, em Portugal, guitarras de tipo espanhol, com cordas de nylon.

No entanto, as guitarras que se ouvem nos discos dos anos setenta, na música portuguesa, já soam como americanas, ou japonesas, incidentalmente.

A forma particular da guitarra americana, produz um som diverso e mais límpido, por causa das cordas metálicas, em bronze ou aço.

Nessa altura, uma guitarra americana, em Portugal, original ou mesmo uma imitação, era algo que pura e simplesmente não se encontrava à venda, devido às restrições nas importações. Além disso, tirando uma ou outra loja de artigos musicais, não havia mercadorias do género. A Valentim de Carvalho ou a Ruvina do Porto, comercializavam alguns instrumentos, mas guitarras acústicas, desse género, só me lembro de ver as japonesas Yamaha e nem todos os modelos.

Logo, o sítio onde se poderia encontrar algo com interesse, era a…Espanha.

Foi por isso, com grande expectativa que abalei, num dia de Outubro de 1976, até Vigo à procura do Eldorado em forma de loja de instrumentos musicais e à espera de encontrar uma Epiphone em conta, pela qual ficara apaixonado só de a ver em anúncio ou uma Morris também por conta das imagens de anúncio e que imitava na perfeição a mais perfeita das guitarras: a Martin D-45, no modelo construído nos anos 40, antes da guerra e que era o instrumento preferido dos músicos dos C.S.N& Y.

Sabia exactamente como queria o braço e as mecânicas das cordas; as incrustações que desejava ver; o tipo e desenho específico de tampo e corpo do instrumento, bem como o tamanho exacto da caixa de ressonância e a forma arredondada com as particularidades simétricas do desenho específico, ao milímetro.

Assim, numa das ruas da velha cidade galega, encontrei o sítio da busca: uma loja de instrumentos com várias guitarras expostas num armário de parede, a toda a largura e altura. Os olhos de conhecedor amador, saltaram de modelo para modelo, para encontrar o ideal, para o dinheiro disponível.

Levava na memória a lição aprendida na leitura de um antigo jornal Melody Maker, de 1975. Demorar na escolha; olhar para todos os pormenores, apreciar o som, reparar na distância das cordas ao braço e atender à perfeição da construção. Nenhuma guitarra soa da mesma maneira, porque a madeira não é um material estável, embora o som de alguns modelos seja rapidamente identificado pela sua particular natureza.

Nenhuma daquelas por que ansiava, estava lá, dependurada no armário de vidro. Aliás, nem sequer eram conhecidas, mas encontrei uma que me satisfez e agora, passados trinta anos, sei que foi uma boa escolha.

Havia duas ou três, passíveis de escolha, pelo preço e pelas características. Depois de mirar, remirar, completamente fascinado pelo panorama, dedilhar em modo principiante ainda sem calo nos dedos, ouvir o som demoradamente e mesmo desafinado, a ressoar na caixa de madeira, procurando a imitação mais perfeita do som em disco que costumava ouvir e depois de olhar para os modelos, comparando-os com as referências originais, escolhi: uma Kiso-Suzuki, de fabrico japonês, imitação das americanas da C.F.Martin, a referência máxima nesse tipo de instrumentos. Ainda hoje é uma magnífica guitarra e as referências colhidas na Rede, confirmam junto de outros compradores da mesma época que essa guitarra, foi o resultado de uma produção feliz, dos japoneses, ávidos de entrar no mercado europeu, nos anos setenta, com imitações das guitarras americanas. Como aliás se pode ler, aqui.

Nas imagens que seguem, a história da descoberta de um objecto fantástico que obriga a uma disciplina árdua, para se retirar todo o prazer do seu uso.

Em primeiro lugar, as imagens do fascínio sonoro, através da imagem. A primeira é do duo Crosby and Nash, com uma Martin D-45, dos anos 40.




Duas imagens da revista Rolling Stone, de configuração do tipo de guitarra e da forma exacta pretendida.












O anúncio da Epiphone, publicado numa revista National Lampoon do ano de 1975. Ao lado uma imagem sonora de uma guitarra, do grupo francês Ange, também de 1975 e publicada na revista francesa Best.











Uma Kiso-Suzuki, modelo idêntico ao que comprei em Vigo, da mesma época e com a mesma cor da madeira e o modelo original, da Martin, numa versão de 1976.
























O artigo de referência do Melody Maker, um guia do comprador esclarecido e o preço manuscrito da Epiphone.

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